Histórico documentado sobre o mais icônico político mandador na comarca santa-cruzense-do-rio-pardo, o famanaz coronel Antonio Evangelista da Silva, alcunhado Tonico Lista, nome amado e odiado tanto que, ainda no ano de 2022, desperta paixões, causa polêmicas.
A sanha dos adversários de Lista
O jornal ‘O Estado de S. Paulo’, sobre acontecimentos santa-cruzenses entre março de 1920 a julho de 1922, publicou “A verdade dos factos – Santa Cruz do Rio Pardo”, matéria assinada pelo santa-cruzense identificado ‘F. de Assis’:
— “Mancommunados assim o juiz, o promotor e o delegado de policia, influindo francamente na formação de um partido opposicionista, o plano teve principio: vencer, o coronel Evangelista, de qualquer forma. Fundou-se um jornal de opposição, com o titulo d’O Trabuco, em cujas columnas se annunciava a morte do chefe governista.”
— “Um advogado da opposição, actual chefe governista de Santa Cruz do Rio Pardo, dias antes do assassinio do coronel Evangelista, proclamava em um vagão da “Sorocabana” que a vida do “Tonico Lista” estava por um fio. E emquanto annunciava o assassinio do adversario, o dr. Doria pedia garantias de vida ao dr. Cardoso Ribeiro. Era o lobo a vestir-se com pello de cordeiro, porém deixando a ordem [de fora].” (O Estado de São Paulo, 14/12/1922: 20).
— O jornal ‘O Combate’ (14 /03/1925: 2), ratificou F. de Assis, ao citar o Ataliba Vianna chefe político santa-cruzense.
Quanto ao coronel Arlindo Piedade, este teria razões para opor-se ao Lista, desde o princípio suspeito na morte do seu irmão, Emygdio José da Piedade Filho, no entanto, manteve-se unido ao suspeito (O Combate, 19/03/1921: 1), por medos, interesses ou, sabe-se lá o que.
O que muitos sabiam, apenas posteriormente o facínora Ozório Alves de Lara categorizaria, no julgamento de Lista, no ‘Caso dos Irmãos Rocha’:
— “Que foi o Coronel Antonio Evangelista da Silva o autor da morte de Emygdio Piedade Filho, mas, que não foi processado porque era chefe, e mandava na Justiça, e, em tempo, os jurados eram seus (…). Não depos isso na ocasião do [facto] por falta de garantias.” (O Estado de São Paulo, 25/08/1921: 10, Defesa do Coronel Antonio Evangelista da Silva, Processo Crime – dos autos – ‘O Caso dos Irmãos Rocha’)
Pelo mesmo Ozório Alves de Lara a grave revelação, que em nada interessava aos opositores de Lista:
— “(…) ao tempo do assassínio de Emygdio Piedade Filho, o juiz de direito de Santa Cruz era o DR. CARDOSO RIBEIRO, actual secretario da Justiça, pessoa que a opposição não tem em vista atacar (…).” (O Estado de São Paulo, 25/08/1921: 10, (…) – ‘O Caso dos Irmãos Rocha’).
— Interessante lembrar que ‘o juiz Cardoso Ribeiro acompanhou o primeiro suspeito mandante, João Custódio, à Delegacia de Polícia para depor e, em seguida, liberado’ (Correio Paulistano, 25/02/1908: 3).
O secretário Cardoso Ribeiro e o coronel Arlindo Crescêncio Piedade, aproximados talvez por interesses comuns de vinganças e numa mesma grei política, sabiam que, para qualquer viabilidade político-partidária em Santa Cruz, Tonico Lista teria que ser supresso, a qual preço fosse, e o mistério do seu assassinato encerra-se nessas combinações entre Ribeiro e Piedade.
O delegado Coriolano assumiu as investigações contra o Antonio Evangelista da Silva. Doravante o coronel teria contra si acusações de outros quinze processos de crimes de morte e atentados, todos desarquivados, alguns provavelmente forjados, outros refeitos, e, mesmo dentre os extintos, aqueles de maior impacto, com testemunhos seguros.
Três averiguações foram destacadas nos quais o Lista figuraria mandante: o espancamento ao dr. Francisco Giraldes Filho; o assassinato de Fernando Foschini; e o assassínio de José Rocha.
– O espancamento do dr. Giraldes
Sobre o espancamento do Giraldes o delegado separou-o do ‘Caso Foschini’, e descartou Ozorio Bueno como mandante, para recair a culpa diretamente sobre o Lista, o dr. Américo Paranhos e o Francisco Rodrigues Costa, fundamentado nas declarações da vítima e no testemunho de Eufrazina Silva Brito, a ‘dona Nenê’, que presenciara conversas dos indiciados e a ameaça dada por Lista.
O promotor público Ricardo Gumbleton Daunt ofereceu denúncia contra:
— “Antonio Evangelista da Silva, dr. Américo F. Paranhos e Francisco Rodrigues Costa, presidente, secretario e membro do directorio situacionista local, respectivamente, assim como Nabor Lara Toledo e João de Paula Garcia).” (O Combate, de 27/04/1921: 1).
Para a promotoria pública era evidente a participação dos membros do diretório perrepista local na decisão do espancamento a Giraldes, e Lista debateu-se exaustivamente sem se livrar da suspeição de mandante do atentado.
Situação agravada, Giraldes constituiu Ataliba Pereira Vianna, seu patrono para atuar junto à Promotoria, no processo crime contra Tonico Lista e outros, como responsáveis pelo seu espancamento em Chavantes (O Combate, 04/05/1921: 3).
O judiciário pronunciou o coronel, pelo espancamento de Giraldes:
— “O juiz de direito da comarca de Santa Cruz do Rio Pardo, dr. Arthur Mihich, ponderando mui criteriosamente todas as provas accumuladas contra o conhecido mandão, pronunciou Tonico Lista e seus capangas Nabor de Lara Toledo e João de Paula Garcia, (…). E consequentemente ordenou referido juiz fossem extraídos mandados de prisão contra os réus, arbitrando ao mesmo tempo em 1.000$000 a fiança provisoria com relação ao mandante e 300$000 para os executores.” (O Combate, 18/07/1921: 3).
Lista recorreu da sentença e livrou-se do caso, quase ao mesmo tempo em que promotoria oferecia nova denúncia no assassinato de José Antunes da Rocha.
– O assassinato contra Fernando Foschini
O delegado Coriolano intentou envolver o Tonico Lista no crime perpetrado contra Foschini, todavia sem provas decisivas, quando já presos, por ordem judicial, os suspeitos mandantes, intermediários e executores, aguardando julgamento: Eduardo Salgueiro – prefeito; José Antonio Rabello – o vice-prefeito; Affonso Salgueiro – 1º Juiz de Paz; e João Rodrigues Junior – vereador; todos residentes e domiciliados em Ourinhos, e mais os executores Francisco da Silva Coelho – 1º delegado suplente no lugar, e o facínora José Manoel de Avilla.
A oposição não dava tréguas ao coronel, anunciando-o mandante da morte de Foschini. Também atacaram, pela grande imprensa e jornais locais os patronos de Lista, pela coragem em defender um assassino.
— Lista contratara os melhores causídicos do país para sua defesa: Julio Prestes, Altino Arantes – a seus tempos chefes do governo paulista; e Raphael Corrêa de Sampaio, professor e atuante deputado federal. Atuava na lide, ainda, o santa-cruzense Pedro Camarinha.
O coronel viu-se excluído do caso Foschini, porém os acusados mandantes foram condenados a vinte e um anos de reclusão e os executores a trinta anos (A Ordem, 02/06/1922: 1-2, reportagem própria e transcrições de jornais da capital), depois absolvidos num segundo júri aos 24 de novembro de 1922, também em Santa Cruz, presidido pelo mesmo juiz, dr. Arthur Mihich. A apelação do promotor público não reformou a segunda sentença.
— Lista já estava morto e não havia interesse em manter presos aqueles que, certamente, dele recebiam ordens.
Frustrado, por não levar Tonico Lista ao banco dos réus, Coriolano se viu, ainda, denunciado em forjar provas, forçando confissões dos presos que o coronel Lista recomendara a morte de Foschini. A denúncia, comprovada, obrigou o delegado buscar formal e testemunhado desmentido dos presos, registrado aos 30 de maio de 1921, no ‘Cartório de Registro Geral, Livro 1-A, Registro de Títulos, folhas 460 nº 1032’ (A Ordem, 02/06/1921: 3, referência).
O estrago estava feito, e Coriolano, desgastado foi removido para Jaboticabal, por Decreto de 15 de setembro de 1921, e, em seu lugar, pelo mesmo Decreto, nomeado o dr. Victor Brenneisen (DOSP, 17/09/1921: 5721).
Coriolano, no entanto, conseguira incriminar Lista no assassinato de José Rocha, ocorrência de 1919, como trama do coronel para eliminar desafetos censuráveis, e então promover a seleção de diligências, em sintonia com o juiz Arthur Mihich e o promotor Ricardo Gumbleton Daunt.
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