No ano de 1924 Santa Cruz do Rio Pardo, nos momentos de uma política local capenga, viu-se assolada pelos acontecimentos da ‘Revolução de 1924’, movimento militar paulista, na esteira do Tenentismo – eram os mesmos da ‘Revolta dos 18 do Forte de Copacabana’.
O tenentismo paulista aos 05 de julho de 1924 promoveu levante, sob a liderança de Isidoro Dias Lopes – o ‘Marechal da Revolução’, como desdobramentos de movimentos precursores e insatisfação da classe média urbana contra o governo.
Em Santa Cruz do Rio Pardo a notícia foi divulgada pela imprensa no dia 12 de julho de 1924, sem muitas distinções das verdades e dos boatos que chegavam desde as últimas horas do dia 5, que em São Paulo – Capital, o exército rebelara-se e havia tomado posições contrárias ao governo paulista forçando-o não se juntar às forças federais.
Também se comentava as interceptações dos revoltosos nos meios de comunicações, correspondências e notícias diversas, ou que os regimentos de Santana, Quitaúna e Itu tomaram as armas e entraram em conflitos com as forças legais – marinha e exército, e que as forças rebeladas de Mato Grosso e dos estados do sul haviam prendido os presidentes dos respectivos estados, e o comandante da ‘Região Militar de São Paulo’, “e com esses boatos correram muitos outros, a que entretanto, nenhum crédito se poderia dar, porquanto nos não chegavam de fontes seguras”, conforme informava o hebdomadário ‘A Cidade’ (12/07/1924: 1).
Naquela semana, informações pela mesma fonte, “os trens de passageiros estão correndo apenas até Sorocaba, havendo interrupção do telegrapho.”
‘A Cidade’, edição de 12/08/1924, noticiava que os rebeldes apossaram parte da ‘Estrada de Ferro Sorocabana’, após Sorocaba rumo ao interior, espalhando-se pelas cidades saqueando as repartições públicas e estações ferroviárias, arrecadando grandes somas em dinheiro. Consoante informações, o líder político Leônidas do Amaral Vieira e o dr. Vasco de Andrade estavam em Itapetininga patrioticamente incorporados às “forças legaes que operaram contra os revoltos naquelle sector.”
Santa Cruz viu-se assolada pelos acontecimentos de 1924, com os atos que “Orestes C. de Castro – Tenente. Figura saliente nas forças revolucionarias, praticou violentas extorsões. Assaltou a Collectoria federal em Santa Cruz do Rio Pardo, onde extorquiu da Camara a importancia de vinte contos de réis” (Estado de São Paulo, 02/01/1925 dos inquéritos), num cheque assinado pelo prefeito, dr. Pedro Cesar Sampaio (Movimento Subversivo de Julho, 1925: 241 – relatório).
Tratava-se do revolucionário Orestes Corrêa de Castro e a horda rebelde em fuga das tropas legalistas, ocupando cidades servidas pela ferrovia, ou a ela adjacentes, com extremada violência e aterrorizando populações, conforme a mesma reportagem: “Em Ourinhos, a ponte que liga os Estados de São Paulo e Paraná ficou inutilisada, tendo sido incendiada e dynamitada. Todas as cidades da zona, Piraju, Santa Cruz do Rio Pardo, Assis, Presidente Prudente, etc, sofferam vexames das requisições, violencias e damnos.”
— Orestes Corrêa de Castro suicidou-se em Buenos Aires, Argentina, em praça pública, onde refugiara-se em 1925, aos 31 anos de idade, sob a identidade de Paul Drapier de Castro, por motivos nunca suficientemente esclarecidos (Diário Nacional, SP, 10/09/1927: 5).
Outro dos líderes da revolução, João Cabanas, permaneceu por alguns dias na região de Santa Cruz, e descreveu essa sua passagem com detalhes, de sua amizade com o Octacilio Piedade e o pressentimento de traição desse seu amigo e, de resto a família Piedade, denunciadores de sua presença às tropas do governo acolhidas pela família em Espírito Santo do Turvo.
Cabanas narrou os saques a repartições públicas na região, as suas conversas com os políticos e descreve, em detalhes, encontro com autoridades santa-cruzenses, mencionando o líder político, o promotor e o delegado de polícia, dos quais suspeitou sobre possível atentado que sofreria na estrada entre Santa Cruz a Ourinhos, detendo os três e deles obtendo a delação:
— “Amedrontados me confessaram, que effectivamente haviam outros que não elles preparado uma emboscada no caminho, e que havia em Espirito Santo do Turvo uma força governista” (Coluna da Morte, publicação Folha do Povo, Maranhão, 20/11/1926: 2).
O revolucionário não citou nomes, apenas os cargos, e por aí identificados o Viriato Carneiro Lopes – promotor público local desde 03 de maio de 1924; o Athos Ribeiro – delegado de polícia nomeado pelo Decreto de 09 de maio de 1924; e o chefe político na ocasião, dr. Pedro Cesar Sampaio, prefeito eleito pela Câmara (A Cidade, 25/01/1924: 1).
Sempre que o líder político Leônidas do Amaral Vieira se ausentava do município, o dr. Pedro Camarinha era o seu substituto político natural, porém desde junho de 1924 ele residia em São Paulo (Correio Paulistano, 1º/07/1924: 4), e o dr. Pedro Soares Sampaio Doria – presidente da câmara, havia se retirado temporariamente, restando o prefeito Pedro Cesar Sampaio.
— O advogado Pedro Camarinha retornaria a Santa Cruz no ano seguinte (Correio Paulistano, 13/06/1925: 4).
O atentado contra Cabanas, então, fracassou com a mudança de itinerário, e conhecido o autor da tocaia, Agnello de Souza, o Araruama, em combinação com o Coronel Clementino Gonçalves, de Espírito Santo do Turvo, conhecedor da região.
A demora de Cabanas impacientara seus companheiros, imaginando-o preso em Santa Cruz pelas tropas governistas, “a ponto de abandonarem as trincheiras, seguindo rumo áquella cidade”, e Santa Cruz foi então sitiada por homens dispostos:
— “Armados de duas metralhadoras pezadas e dois fuzis metralhadores dispostos varrerem a cidade a bala, se eu não aparecesse. Felizmente cheguei a tempo de mandar um proprio com a ordem de fazer essa força retroceder.” (Op.cit. Folha do Povo, 23/11/1926: 2, palavras de Cabanas).
O Chefe da Estação Sorocabana de Santa Cruz chegou com o dinheiro restante requisitado por Cabanas, e então os três prisioneiros e um quarto, cunhado do ferroviário, foram libertos.
Leônidas do Amaral Vieira, confirmaria a passagem de João Cabanas por Santa Cruz: “(…) cuja Camara foi extorquida na quantia de vinte conto de reis, pelos mashorqueiros de 1924 à frente dos quaes estava Cabanas sob ameaça de saque e depredações quando assolavam esta zona em fuga desabalada para o porto Tibiriçá” (Diário Nacional, São Paulo, 16/09/1927: 1).
As ocorrências de 1924 foram traumáticas, desgastantes e desmoralizadoras para a câmara e a prefeitura.
Acontecimento polêmico, consequente, dizia respeito da fuga do presidente da câmara, dr. Pedro Soares de Sampaio Doria, quando Santa Cruz do Rio Pardo ‘ocupada’ pelos revoltosos. Depois o Presidente tentaria se explicar, no plenário, que a ausência ocorrera em razão de sua família encontrar-se na Capital do Estado, quando da rebentação revolucionária, e que para lá dirigira-se em data de 08 de julho de 1924.
É fato conhecido que dona Ada, esposa do Dr. Sampaio Doria dera à luz, em São Paulo, a primeira filha do casal – Maria Sylvia, aos 05 de junho de 1924 (Correio Paulistano, 1º de julho de 1924: 4). O Presidente Sampaio Doria teve muito que explicar e jamais convenceu o motivo de sua não presença no município, quando da chegada dos sediciosos de 1924.
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