Leônidas Camarinha, conhecido por ‘Lulu’ Camarinha, filho de João dos Santos Camarinha e de Alexandrina Camarinha, de família vinculada ao ‘Partido Republicano Paulista – PRP’, onde o seu irmão Pedro Camarinha um dos expoentes nos anos de 1920.
Provisionado pela Ordem dos Advogados do Brasil e escrevente habilitado do juízo da direito da comarca de Santa Cruz do Rio Pardo (A Cidade, 28/03/1926: 3), a saga política de ‘Lulu’ Camarinha iniciou-se na Revolução de 1930, quando preso com outros santa-cruzenses, para fazer-se líder a partir de 1938, atraindo e revelando importantes nomes da política local, a exemplos de Lucio Casanova Neto, Onofre Rosa de Oliveira, Carlos Queiroz e Joaquim Severino Martins, entre outros, que se tornaram sucessores, dissidentes ou não, e determinadores políticos do lugar até o final do século XX.
Herdeiro ou seguidor político do irmão, Pedro Camarinha – o coadjutor, primeiro do coronel Tonico Lista e depois do Leônidas do Amaral Vieira, ‘Lulu’ recebeu o apoio dos saudosos do coronelismo ‘perrepista’, conquistou os descontentes da administração de Pinheiro Guimarães (1930/1935), que vislumbravam possibilidades ainda no Governo Getúlio – o ‘getulismo’ extraconstitucional – para a promoção de interesses próprios.
Neste tripé político, típico caudilhesco e de interesses ideológicos distintos, Camarinha teve cinco anos de oposição para firmar liderança política e acercar-se de nomes influentes nos setores tradicionais da sociedade.
Midiático, ‘Lulu’ Camarinha, de líder político perrepista em 1934, vereador opositor na câmara eleita em 1936, torna-se a prefeito nomeado pelo interventor paulista, Adhemar Pereira de Barros, pelo Departamento das Municipalidades – Decreto de 23/06/1938 (DOSP, 24/06/1938: 3), cuja posse em grande estilo aos 03 de julho de 1938 (Correio Paulistano, 05/07/1938: 5), para solidificar em Santa Cruz a ‘Era Camarinha’ que perduraria por décadas.
Tinha estilo político comunicacional, agradava os eleitores e empolgava até adversários, e fazia largo uso dos microfones da ‘Rádio Audição Pública’ na atual Deputado Leônidas Camarinha; e depois, do ‘Serviço de Alto-Falantes – SAF’, mesmo endereço; e, por fim, da ‘Rádio Difusora Santa Cruz’, concessão que lhe foi dada para tornar-se sócio proprietário.
Nos tempos do líder político Leonidas do Amaral Vieira, através do seu lugar-tenente o advogado Pedro Camarinha, instalou-se um ‘aparelho radiotelefônico, receptor e emissor via alto-falantes’, tipo cornetas, numa sala térrea do edifício hoje de três pavimento, à rua Conselheiro Antonio Prado ou atual Praça Deputado Leônidas Camarinha, para serviços de som, voltada a espaços publicitários pagos por empresas privadas interessadas, anúncios avulsos, e informes da prefeitura – de utilidade pública, que custeava maior parte dos gastos e gerava lucros.
—A radiotelefonia tornou-se ‘Radio Audição Publica’, em 1932, após a edição do Decreto Federal 21.111, de 1º de março de 1932, regulamentando a execução dos serviços de radiodifusão, nele enquadrando-se a radiotelefonia, como radiocomunicação, por meio de palavras ou sons, livremente recebidos pelo público, voltada para o entretenimento, com exigências em manter níveis civilizados e não atentatórios à moral e cidadania, etc, e de retransmitir programas educacionais e oficiais de governo, com liberdade em divulgar notícias captadas das emissoras das capitais.
—A ‘Rádio Audição’, com maior alcance e qualidade de som – com os alto-falantes colocados no alto do prédio, alcançava praticamente toda a cidade, daí a melhora de sua grade de programação envolvendo noticiários, musicais, incentivos culturais, participações públicas ‘ao vivo’, maior comercialização de espaços para propagandas particulares, e, num gesto autoritário do prefeito Abelardo Pinheiro Guimarães, as programações eram censuradas e as transgressões sujeitas a punições, inclusive fechamento, o que parece nunca ter ocorrido, diante da obrigatoriedade das divulgações publicitárias gratuitas de atos do governo municipal, e dos informes de interesse público.
—A ‘Radio Audição’, propriedade oculta do tenente-coronel Leônidas do Amaral Vieira, era empresa em nome do advogado Pedro Camarinha e por ele administrada.
—Com a queda do governo Abelardo Pinheiro Guimarães e a nomeação de Leonidas Camarinha como prefeito nomeado, a Rádio passou a ser vitaminada com recursos públicos.
Ano a ano, de 1939 ao final de seu governo municipal, fez publicar todos os seus feitos de administrador público, como prestação de contas à população, inclusive com edições pela Livraria Acadêmica de São Paulo – Saraiva e Cia, comparando sua administração com a anterior e mostrando, exercício a exercício, o progressismo municipal.
O prefeito Camarinha também fez uso político do esporte, pela ‘Associação Atlética Santa-cruzense’, a quem beneficiou com a desapropriação de terrenos para a construção de estádio que levaria o seu nome, projeto inserido num pacote de obras, como a construção de um parque infantil – Decreto-Lei Municipal de nº 12, de 20 de dezembro de 1940, e, numa etapa seguinte, a construção da ‘Nova Santa Casa’ – que se tornou o Hospital Maternidade ‘Dona Maria Perpétua Piedade Gonçalves’ – Decreto Municipal nº 48, de 26 de outubro de 1944.
O parque infantil e o hospital, concluídos, mas não o estádio de futebol que parte se tornou praça, parte escolas, além dos terrenos dentro da área acertada conforme referido decreto-lei.
‘Lulu’ fez-se, via dinheiro público, financista e mantenedor do hebdomadário ‘A Cidade’, em 1941, quando deixou de ser vinculado a um partido político para dizer-se independente.
Como prefeito, também pelo município, foi um dos patrocinadores da obra de Leo Azeredo (“Cidades que renascem 1943: 61-63”, edição única, de grande porte, custeada por associação de municípios cujos prefeitos apologizados, e todo um capítulo para Santa Cruz, com exaltações à terra, ao trabalhador, ao progresso devido ao aumento populacional, ao incremento agrícola – algodão e cereais e a intensificação comercial e industrial na sede do município.
Azeredo informou das construções de novos prédios comerciais, residenciais e públicos, das medidas de saneamento básico, da fiscalização e aplicação equitativa das rendas municipais, priorizando as atenções à saúde pública – prevenção, vacinação e profilaxia, ao sistema educacional, a estrutura ferroviária disponível e das estradas de rodagem, sem se esquecer a população de 62 mil habitantes, sendo doze mil na área urbana e outros restantes na zona rural, praticamente reprodução do que Leônidas já informara dois anos antes: “A cidade de Santa Cruz do Rio Pardo acusa aproximadamente um total de 10.000 almas enquanto a zona rural do município é ‘habitat’ para outras 50.000.” (Prefeitura, Índice de Avaliação e Estatísticas, Governo Leônidas Camarinha, 1940: 11); e o fecho dado por Azeredo foi o óbvio, sem rodeios:
—”Agora uma pergunta se impõe: a quem se deve o reerguimento daquela velha cidade, que nada mais era que um ‘burgo-velho’, ainda, há pouco mais de quatro anos?
Ao seu atual prefeito, dr. Leonidas Camarinha, cuja administração tem encarado com rara energia. (…). Em toda a parte avultam as suas realizações que fazem vibrar de contentamento a alma de seus concidadãos.”
Para, então, arrematar: “Leonidas Camarinha é bem o espírito construtivo da estirpe bandeirante.”
Pela vontade do Leônidas, Santa Cruz teria 60 mil ou mais ‘almas’, enquanto o censo oficial de 1940 revelava 44.578 moradores.
À frente do executivo soube aproveitar a oportunidade para remodelar a cidade e concretizar ações de saneamento básico, fazendo-se prefeito tocador de obras vistas e divulgadas, como a pavimentação da cidade, as reformas de prédios públicos, implantação do serviço público de água e rede de esgoto – enfim, em parte resolvido, arborização e modernização das praças principais, das quais a central hoje traz seu nome.
Também foi o grande responsável pela fundação do Aero Club Santa Cruz, presidido por Benedicto Carlos da Silva, e a instalação do hangar (O Estado de S. Paulo, 22/07/1939: 6. DOU, 25/04/1942: 6853 – deferimento).
Audacioso, da mesma forma formou o Aero Club Rio Turvo, em Espírito Santo do Turvo, cuja diretoria formada por moradores daquela localidade e de Santa Cruz do Rio Pardo (DOSP, 27/02/1941).
Para cada feito de governo uma “Comissão Patrocinadora de Homenagens”, ‘voluntária e independente’, organizava festejos e desfiles, diurnos e/ou noturnos – marcha luminosa – precedidos de alunos, escoteiros, professores e normalistas, comerciantes e autoridades, conforme uma apologética matéria veiculada na grande imprensa paulista (O Estado de S. Paulo, 22/07/1939: 6).
Leônidas sobreviveu, politicamente, a queda do seu padrinho Adhemar de Barros, em 1941, continuando prefeito em Santa Cruz do Rio Pardo, durante o governo do interveniente Fernando Costa (1941/1945), porém exonerado pelo nomeado seguinte, dr. José Carlos de Macedo Soares (1945/1947), através do Decreto de 17 e publicado aos 18 de abril de 1946, sendo no mesmo ato nomeado prefeito o médico Pedro Cesar Sampaio.
O prefeito Camarinha foi exonerado no governo Macedo Soares:
—”(…) com a divisão do estado em zonas de influências políticas a cidade de Santa Cruz foi incluída no distrito do sr. Cesar Vergueiro.” (…). “Ora, o sr. Silvio de Campos, não sabemos bem porque motivo, resolveu intervir na política daquela cidade e para isso aproveitou a ausência do sr. Cesar Vergueiro no Diretorio Central, e fez a remessa do oficio ao interventor com a indicação do novo prefeito.” (Jornal de Notícias, 23/04/1946: 3).
A exoneração de ‘Lulu’ Camarinha aconteceu por telefone: “Mario Tavares [Presidente da Executiva do PSD e simpático a Silvio de Campos] telefonou do Banco do Estado ao encarregado da Secretaria do Partido, solicitando a demissão dos prefeitos de Santa Cruz do Rio Pardo e São Pedro do Turvo, com a indicação de novos titulares” (Jornal de Notícias, 05/05/1946: 6), com urgência, dispensando parecer do ausente Cesar Vergueiro [a cuja ala pertencente o município de Santa Cruz do Rio Pardo].
A queda do Camarinha. deixou um vazio político santa-cruzense, ante a ausência de um líder capaz de pacificar adversários e companheiros; causou estragos na política local e na interventoria.
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